Por Katiuscia Mello Figuerôa, doutora em Ciências da Atividade Física e Desportiva, professora da área de Linguagens Cultural e Corporal nos cursos de Licenciatura e de Bacharelado em Educação Física do Centro Universitário Internacional Uninter
Já houve jogos cancelados nas principais divisões do país
No mesmo fim de semana em que o Brasil ultrapassou a triste marca de 100 mil mortes pela COVID-19, aconteceu a estreia do Campeonato Brasileiro de Futebol – o Brasileirão 2020. No entanto, mesmo com normas de cuidados estabelecidas pela CBF, como partidas sem torcedores nos estádios, testes regulares para jogadores, árbitros e técnicos ou o veto à execução de hinos e cumprimentos entre os atletas, uma das partidas de estreia da série A (marcada para 09/08) foi adiada porque uma das equipes teve 9 jogadores testados positivo antes do jogo. A partida seria entre Goiás e São Paulo e o Superior Tribunal de Justiça Desportiva decidiu, minutos antes do horário marcado para o enfrentamento, que este seria adiado – o time rival (visitante) já estava em campo.
Somente até a primeira semana do Brasileirão, mais de 150 atletas das equipes da série A testaram positivo para o coronavírus. Em apenas quatro dias de competição, foram 40 atletas entre as séries A, B e C. Corinthians e Goiás são os times que tiveram o maior número de jogadores contaminados até o momento, sendo que o Goiás teve 10 atletas diagnosticados com a doença no intervalo de 10 dias.
O calendário da competição – com previsão de encerramento para 24 de fevereiro de 2021 – corre o risco de virar uma grande confusão com os possíveis adiamentos que teremos pela frente e, o mais importante: há muitas vidas colocadas em risco com esse retorno. Além dos atletas, técnicos, árbitros, entre outros envolvidos em uma única partida, todas estas pessoas têm familiares.
Estas são provas indiscutíveis de que o retorno do futebol no Brasil foi uma decisão apressada. Ao contrário das principais ligas europeias, que aguardaram a redução das mortes para o retorno de suas competições, o Brasileirão teve início em pleno pico da pandemia no país. Na realidade, o ideal era não haver competições em meio a uma pandemia, visando, principalmente, à preservação da saúde e da integridade física (e também psicológica) dos envolvidos, mas também a proporcionar um maior equilíbrio no que se refere à competição entre as equipes, já que estas sofrem com os desfalques devidos à doença.
Tentando reparar seus erros, a CBF divulgou mudanças no protocolo de testagem nas competições nacionais logo depois da estreia do Campeonato Brasileiro de 2020 – a testagem foi ampliada para todo o elenco a cada rodada, não sendo mais exigida apenas para os 23 jogadores relacionados para a partida, os clubes poderão realizar exames em laboratórios locais, descentralizando a responsabilidade do Hospital Albert Einstein, de São Paulo, e os resultados deverão ser enviados à CBF 24 horas antes da partida pelos clubes mandantes e 12 horas antes da viagem pelos clubes visitantes.
No entanto, chegamos ao ponto de termos, em nosso país, atletas liberados para jogar mesmo sendo diagnosticados com a COVID-19. Isso mesmo sabendo que não há embasamento científico para se afirmar que pessoas que já foram infectadas estejam imunes ao vírus, entre tantas outras incertezas que ainda há quando o assunto é essa doença. Vale lembrar que estes atletas jogam sem proteção nenhuma, não há como evitar o contato físico e há cidades em que nem o técnico precisa utilizar máscara.
De qualquer forma, não há como realizar o Campeonato Brasileiro de Futebol – ou qualquer outra competição esportiva – em 2020, de forma justa, com igualdade de condições a todas as equipes e sem colocar vidas em risco. Nos resta saber se dirigentes (os sensatos), sindicatos e atletas se calarão perante toda essa confusão. Será que dá jogo?
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