O futebol as vezes é justo e consagra - Pela sexta vez, a Europa é do Liverpool

Por Lucas Paes

Salah, outro predestinado, marcou o primeiro gol da final (Foto: AFP)

O futebol as vezes é implacável, cruel e duro, mas as vezes é justo, extreamente justo e coroa times que merecem entrar na história. Madrid hoje recebia mais uma vez uma final de Liga dos Campeões da Europa, dessa vez no novo estádio do Atlético de Madrid, o Wanda Metropolitano. E ele, tão novo, já viu a história, viu a consagração, viu a coroação e o fim de um calvário: o Liverpool, com muita justiça pela campanha, talvez nem tanta pela partida, é pela sexta vez campeão europeu. O jejum de títulos acabou e o peso nas costas dessa geração também. Klopp, tão preciso em montagem de elenco, agora está consagrado. Hoje a noite não vai acabar em Liverpool.

O Liverpool passou por momentos muito complicados nos anos recentes e vem renascendo. Fez na Premier League uma campanha absurda, que acabou ultrapassada pela mais absurda ainda campanha do Manchester City. Na Champions, o time teve momentos claudicantes e só chegou ao mata-mata devido a uma defesa história de Alisson, mas foi chegando, até o milagre de Anfield, os 4 a 0 sobre o Barcelona, a história foi contando seus traços, desenhando suas linhas para que a consagração viesse.

Seu adversário, o Tottenham, eliminou a sensação do torneio, o Ajax, com uma partidaça de Lucas Moura, outro renascido das cinzas. Nunca houve uma final com tantos motivos, dos dois lados, para querer a taça. Só que não seria justo um time que fez tudo o que esse Liverpool fez sair de mãos vazias da temporada. Ao mesmo tempo, não seria justo com uma torcida tão sofrida mais uma página triste. Só um podia sair com a taça. Só um.

Diante de toda a expectativa, a final foi até meio brochante. Com menos de um minuto, Mané jogou a bola na mão de Sissoko, que bobo deixou os braços escancarados dentro de sua área: pênalti, polèmico, controverso, talvez inclusive mal marcado e convertido por Salah, que acabou tirado da final ano passado naquele lance com Ramos. Poucos tinham tantos motivos para marcar na decisão. A vantagem, com um minuto de jogo praticamente, era do Liverpool, a consagração estava mais próxima, mas não viria sem uma dose cavalar de sofrimento, principalmente na segunda etapa.

Porque o primeiro tempo foi um jogo ruim, na mais sincera palavra. Quase nada aconteceu depois do gol. O Tottenham tinha a bola, mas não conseguia criar muito. Os Reds, quando com a bola, sofriam para sequer conseguir arrrumar uma jogada. Era uma atuação sofrivel de ambos os lados, com ambos irreconhecíveis. Sem grandes momentos de tensão, tirando um chutaço de Robertson pelo lado vermelho, a vantagem era do Liverpool, que passaria por provações no segundo tempo.

A etapa final foi de sofrimento, o Spurs continuava pressionando, mas chegava melhor agora. Lucas Moura, criminosamente deixado no banco, entrou e deu outro folego a partir da metade da segunda etapa. Alisson, expectador durante uma parte da partida, fez diversas intervenções, evitou gols de Son, Lucas, Eriksen, justificou, mais uma vez porque é o titular da Seleção Brasileira, para qualquer brasileiro que não entendeu porque o Liverpool pagou tanto dinheiro por ele. 

A pressão chegou a ser insana em alguns momentos e parecia que o destino reservava algo para Lucas, que jogava bem. Mas, no começo da etapa final, entrou um tal de Origi no Liverpool, no lugar do ainda sem ritmo Roberto Firmino. Discreto, porém predestinado, predestinado tal qual esse time do Liverpool, predestinado como Jurgen Klopp, predestinado como Alisson, como Van Djik, como essa camisa que tantas vezes venceu jogos sozinha, como essa torcida que nunca deixou o time caminhar sozinho, como o Anfield que tantas vezes ganhou jogos como um décimo segundo jogador. A bola subiu e sobrou no pé do belga, que chutou no cantinho, estufou as redes e definiu o título.

Klopp, tão bom, tão competente em montagens de times, se cosagra com o erguer da taça por Henderson, o sucessor de um tal de Gerrard. As derrotas do alemão nas finais foram sempre dolorosas e hoje parece que ele, assim como o time aprendeu. Nem sempre se joga bonito para vencer, as vezes é preciso ter experiência, ter sangue frio, que o Liverpool mostrou de sobra nessa final. Frieza como Origi, que explodiu o grito que não vai silenciar tão cedo pelas margens do Merseyside. O Hexa veio, e veio para Liverpool.

A sensação é que é só o começo desse time que já está na história. John Henry, um dos proprietários do Liverpool e da FSG, que administra o clube, já falou que vai tirar o escorpião do bolso para ganhar a Premier League. O peso do jejum de títulos, que fez clara diferença contra os Reds tanta vezes, acabou. Talvez seja apenas o primeiro levantar de taças de um time eterno. A Europa que se preocupe e a Inglaterra que estremeça, pois parece mais claro que nunca: o Liverpool voltou. 
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